quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

O que será do amanhã...

Semana de 07 a 13 de dezembro de 2009


O famoso samba deu o tom das discussões acerca do resultado do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, de 2009, e das perspectivas para o próximo ano. A divulgação do resultado de um crescimento do PIB de 1,3% no terceiro trimestre do ano mostrou um desempenho abaixo do esperado pelo governo e pelos analistas externos, que o estimavam em torno de 2%. O fato provocou um grande alvoroço. Esperava-se que as políticas fiscais realizadas pelo governo federal, para aquecer o consumo interno e aumentar os investimentos, dariam um resultado melhor. Além de ter ficado muito abaixo do previsto, foi desastroso quando comparado com o mesmo período de 2008, pois mostrou uma queda de 1,2%.


Taxas de crescimento do PIB (*)

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Produto Interno Bruto a preços de mercado
Taxa (%) acumulada em quatro trimestres(*)

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  O ministro da Fazenda, Guido Mantega, em entrevista coletiva no dia 10 de dezembro, comentou que, ao contrário do que muitos consideraram, o resultado obtido não foi um “pibinho”, se compararmos com o desempenho dos países da União Européia e os Estados Unidos, que estiveram no centro da crise financeira. Adicionalmente, Mantega afirmou que o desempenho do último trimestre do ano será melhor e que, embora não se atrevesse a adiantar números, está esperando resultados positivos para 2010, em função do aumento dos investimentos e do crescimento da demanda interna.
Apesar de aparentar confiança e otimismo, por via das dúvidas, o governo preparou outro pacote com medidas de desoneração. Depois dos carros, eletrodomésticos, móveis, etc., o governo prorrogou, para junho de 2010, o prazo de isenção do IPI sobre os bens de capital, um dos setores mais abalados com a crise econômica. Dentre os bens de capital beneficiados com a desoneração encontram-se válvulas e congeladores industriais, partes de vários tipos de máquinas e arvores de transmissão. Outro setor beneficiado foi o de materiais elétricos para as indústrias petroquímicas, que tiveram as alíquotas reduzidas à zero, não só para o IPI, como para o PIS-Cofins e os impostos de importação.
As entidades de representação patronal, como as federações das indústrias de São Paulo (Fiesp) e do Rio Grande do Sul (Fiergs), também demonstraram otimismo em relação ao próximo ano. Ambas prevêem crescimento e aumento do produto interno, motivados pelo consumo doméstico.
Um dos indicadores em que se baseiam as previsões dos empresários é a utilização da capacidade instalada, que vem aumentando nos últimos meses, chegando a 80,5%, em outubro, ainda abaixo do verificado há um ano: 82,4%.



Utilização da capacidade instalada na indústria (*)
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Existem dois aspectos relevantes no cenário nacional a serem observados no próximo ano: a situação das exportações e do emprego. Segundo a Fiesp, o emprego no setor industrial terá um comportamento defasado se comparado com a recuperação da atividade no país para o próximo ano. Na comparação de 2009 com 2008, em outubro, a produção industrial caiu 10,6% e o emprego, 5,7%, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE.
A Fiesp informou ainda que a queda das exportações industriais brasileiras é responsável pela metade da queda de 10% da produção do setor ao longo deste ano. Das 22 famílias de produtos industrializados analisadas, 17 tiveram queda das vendas externas.
Diante deste contexto, os empresários consideram que o governo se utiliza da situação internacional para justificar os maus resultados das exportações brasileiras, não levando em consideração a exagerada valorização do real frente ao dólar. Para o gerente executivo de Política Econômica da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Flávio Castelo Branco, “na agenda de combate à crise, o setor exportador ficou em segundo lugar”.
É esperado, portanto, que a recuperação da economia brasileira se dê lentamente e com algumas pedras no sapato do governo, e não se sabe ao certo como elas serão retiradas.
Após meses de atuação direta das entidades monetárias e dos Tesouros de vários países, no intuito de conter a falência do sistema financeiro e de grandes empresas, em um montante (praticamente inimaginável) de 13 trilhões de dólares, vários países estão receosos quanto à restituição dos valores transferidos ou à sua data de retorno aos cofres públicos.
Os temores tornaram-se mais concretos após o Dubai World, braço de investimentos do emirado árabe de Dubai, informar que poderá não honrar os compromissos com seus credores. Um grupo de bancos composto pelo Royal Bank of Scotland (RBS), HSBC, Lloyds e dois bancos dos Emirados Árabes Unidos formou um comitê para discutir a renegociação das dívidas da companhia, algo em torno de 60 bilhões de dólares.
Na Europa, países da Zona do Euro e da região do leste estão com sérios problemas de “saúde financeira”. A Espanha, por exemplo, além de encontrar-se em recessão, espera para 2010 um déficit fiscal de 8,1% do PIB. Na Rússia, a moeda local (rublo) sofre grave desvalorização frente ao dólar, e a Grécia não consegue mais controlar suas finanças públicas, tendo atingido uma dívida pública de 113,4% do PIB.
Para o economista-chefe da DLM Invista, Alberto Rocha, “a crise de Dubai gerou desconfiança sobre o destino das aplicações dos recursos dos bancos europeus e sobre a capacidade de pagamento dos governos”. Conforme Rocha, a maior preocupação é o Leste europeu, uma verdadeira “caixa preta”, já que não se sabe ao certo de quanto dinheiro os países da região vão precisar.
Nos Estados Unidos, o chamado Tarp (Programa de Alívio de Ativos Problemáticos) “investiu” no último ano fiscal, que foi até setembro de 2009, 245 bilhões de dólares no sistema financeiro. O Tesouro norte-americano esperava que, no longo prazo, os lucros com as atividades do programa chegassem a 76 bilhões, contudo, foram reavaliados em 19 bilhões de dólares.
Quanto à recuperação econômica dos Estados Unidos, o presidente do Federal Reserve (Fed, Banco Central dos EUA), Ben Bernanke, listou três fatores negativos que são uma das causas do ritmo moderado de expansão: a fraqueza no mercado de trabalho, a cautela dos consumidores e a oferta limitada de crédito. “Ainda temos um longo caminho a percorrer antes de termos certeza de que a recuperação será sustentável”, assinala Bernanke. 
Conforme dados do Fed, houve um declínio de 3,5 bilhões de dólares no crédito ao consumidor desde julho de 2008. Como o consumo das famílias corresponde a dois terços da economia estadunidense, a menor disponibilidade de crédito configura-se como fator consideravelmente prejudicial à recuperação econômica.
Um dos fatores explicativos da queda do crédito para pessoa física é a menor demanda, pois as famílias encontram-se preocupadas em pagar as dívidas que já têm e em gastar menos. Os dados revelam um processo de adaptação a uma nova realidade pós-crise: Os mercados de títulos lastreados por créditos de veículos e de hipotecas encolheram 33% e 35%, respectivamente, desde o fim de 2007. Em 2005, mais de 6 bilhões de ofertas de cartões de crédito chegaram às caixas de correios das casas norte-americanas, este ano apenas 1,4 bilhão foram enviadas. A Visa informou que, em 2009, pela primeira vez, o uso do débito automático foi maior do que do crédito.
Mohamed El-Erian, diretor presidente da Pimco, uma das maiores companhias de investimentos, é taxativo sobre a realidade econômica nos Estados Unidos: “A idéia de que vamos voltar ao nível em que estávamos é falsa. Será uma jornada atribulada para um novo destino com efeitos de longo prazo significativos”.
Como vemos, se há dúvidas sobre o amanhã, uma certeza parece consolidar-se cada vez mais: a de que o processo de recuperação que agora se inicia na economia mundial será muito lento.


Texto escrito por:
Maria Carolina Costa Madeira: Jornalista, mestre em Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br

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terça-feira, 12 de janeiro de 2010

O Processo de Recuperação com Desemprego

Semana de 30 de novembro a 06 de dezembro de 2009


A indústria brasileira de papelão deverá encerrar 2009 com um desempenho estável em relação ao ano passado. Nos últimos meses do ano, as vendas do setor têm acelerado, mostrando um dinamismo melhor do que o esperado. Considerado como um indicador do nível da atividade econômica, o crescimento do ritmo de vendas de embalagens de papelão aponta para uma possível reanimação da economia brasileira depois da crise. Entretanto, é preciso analisar esse dado com cautela, já que é comum, no período de fim de ano, uma aceleração no ritmo de vendas, como conseqüência da injeção do décimo terceiro salário e outras gratificações natalinas.
O Pólo Industrial de Manaus, também voltou a dar sinais de recuperação. Na última reunião do conselho de administração da Superintendência da Zona Franca de Manaus, foram aprovados 25 novos projetos industriais e de serviços, que somam um total de US$ 462,4 milhões em investimentos. De acordo com dados do Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os setores industriais que produzem para o mercado interno foram os que registraram maior capacidade de recuperação, desde o início da crise. Dentre todos os setores, os de bebidas, perfumaria e produtos químicos estão entre os que apresentaram melhor desempenho, com crescimento de 11,3%, 9% e 3,2%, respectivamente, no mês de outubro, em relação a setembro do ano passado.


Variação (%) da produção industrial em novembro de 2009 com relação ao mesmo mês do ano anterior(*)

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Variações (%) da produção industrial - Novembro de 2009 (*)

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Muitos dados divulgados têm mostrado certo vigor na recuperação da economia brasileira. Entretanto, o economista Paul Krugman, ganhador do prêmio Nobel de Economia em 2008, advertiu para o excesso de euforia em relação ao Brasil. Segundo Krugman, a economia brasileira reagiu bem à crise e se encontra num momento favorável, mas é preciso tomar cuidado com o excesso de otimismo em relação ao país, que tem levado a uma exagerada e preocupante valorização da sua taxa de câmbio. Como se sabe, na medida em que se valoriza o real frente ao dólar, as importações são facilitadas e as exportações dificultadas o que trás grandes prejuízos à indústria nacional.
Além do Brasil, outras economias também estão apresentando sinais de recuperação. Na China, a disparada da atividade industrial, em pleno início do processo de recuperação da economia mundial, vem criando uma enorme preocupação em relação ao excesso de capacidade produtiva que está sendo gerada. Segundo relatório da Câmara Européia de Comércio na China, a capacidade produtiva de aço neste país era de 660 milhões de toneladas em 2008, enquanto que a demanda pelo aço chinês era de 470 milhões de toneladas. A diferença, de acordo com o relatório, é absorvida por novos investimentos, cujo resultado é a criação de uma capacidade produtiva ainda maior. Mas, o acelerado ritmo de crescimento da economia chinesa não está preocupando apenas os analistas econômicos. Especialistas em mudanças climáticas alertam para o perigo que o rápido crescimento da China representa para o Planeta. De acordo com cálculos do Ministério do Meio Ambiente do Brasil, se o país continuar crescendo no mesmo ritmo dos últimos dez anos, as emissões de gases-estufa estarão 130% maiores em 2020, em relação a 2005, cenário considerado catastrófico.
Na Índia, o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu 7,9% entre julho e setembro, em relação à igual período de 2008, conforme divulgado pelo Departamento de Estatística em Nova Déli. No caso dos Estados Unidos, a recuperação continua ocorrendo em ritmo lento e gradual. No setor de construção, por exemplo, os gastos se mantiveram praticamente estáveis em outubro, comparativamente a setembro. 
A reanimação da economia global, nesta fase inicial, tem mostrado que, apesar de alguns países já terem saído da fase de crise/depressão e iniciado a reanimação, o nível de desemprego continua estável e parece estar longe de retroceder. Na zona do euro, a taxa de desemprego manteve-se, em outubro, no patamar mais elevado da última década, segundo o Departamento de Estatística da União Européia. Isto porque as empresas continuam eliminando postos de trabalho, mesmo depois da crise. Em meio a tudo isso, o Banco Central Europeu prepara sua “estratégia de saída” do mercado, para desfazer as medidas de intervenção tomadas para socorrer bancos e instituições financeiras em dificuldades durante a crise.
Na Espanha, empresários de 70 companhias estão planejando investir no Brasil. Analistas espanhóis avaliam o Brasil como a melhor alternativa para os seus investidores, diante da elevada taxa de desemprego do seu país, de aproximadamente 20%, e de uma significativa redução no consumo, fatores que criaram um cenário pessimista para a economia espanhola.
O Unite, maior sindicato de trabalhadores do Reino Unido, entrou em contato com a Kraft, gigante norte-americana do setor de alimentos, para pedir garantias de que não haverá demissões e de que serão assegurados as condições dos empregos e as pensões, caso a empresa compre a Cadbury, companhiamais de seis mil empregados. A Kraft, por meio do seu porta-voz, Michael Mitchell, afirmou que “certasgarantias pretendidas pelos trabalhadores não poderão ser asseguradas enquanto a empresa não entrar nasinstalações da fábrica”.  
Nos Estados Unidos, o descontentamento dos trabalhadores desempregados tem provocado manifestações. Nos últimos quatro meses, dezenas de metalúrgicos demitidos pela ArcelorMittal têm feito piquete em frente aos portões da usina de Hennepin, fechada recentemente pela companhia, que pretende produzir mais utilizando menos recursos e aproveitando melhor a capacidade instalada. A reestruturação das fábricas é uma característica comum em períodos de crise econômica, quando as empresas buscam reduzir custos e aumentar a eficiência técnica e assim, como a ArcelorMittal, muitas outras empresas estão tentando atingir este mesmo objetivo. O resultado é sempre a eliminação dos postos de trabalho que perdem sua função e, portanto, demissões de trabalhadores. Isto significa que o lento e complicado processo de recuperação da economia não será marcado pela criação de um grande número de empregos, mas, ao contrário, pela manutenção de desemprego num patamar mais elevado que o do período que antecedeu a crise.
Esta é uma das características do ciclo econômico no capitalismo contemporâneo que seremos obrigados a suportar.


Texto escrito por:
Diego Mendes Lyra: Mestrando em economia, Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb – Projeto globalização e crise na economia brasileira . 
Email: progeb@ccsa.ufpb.br

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segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Uma recuperação sofrida

Semana de 23 a 29 de novembro de 2009


A recuperação da economia mundial continua em marcha. Como vínhamos falando, a fase de crise do ciclo econômico já foi ultrapassada. Passamos à fase de depressão e estamos lentamente entrando na reanimação. Isto parece ser a voz comum a todos os analistas. O problema que se discute agora é o ritmo desta recuperação e sua solidez. O diretor gerente do Fundo Monetário Internacional, Dominique Straus- Kahn, em Londres, reconheceu que os países desenvolvidos continuam vulneráveis e dependentes dos estímulos dos governos e recomendou a manutenção das políticas financeiras, monetárias e fiscais de apoio, a fim de não estrangular a recuperação. Já o economista chefe do mesmo banco, Olivier Blanchard, em entrevista ao jornal “Le Monde”, alertou os países emergentes quanto à formação de bolhas especulativas, acumulação de reservas e movimentos incontroláveis de capitais, atraídos por juros elevados. O medo de possíveis calotes por parte dos governos ricos, endividados com os trilhões de dólares das ajudas concedidas, assumiu uma forma de manifestação com a declaração do pequeno e rico emirato de Dubai de que o conglomerado estatal Dubai World pediu moratória para uma dívida calculada em US$ 59 bilhões. O efeito Dubai, como passou a ser chamado, propagou-se derrubando todas as bolsas que reagiram com intenso nervosismo. Londres caiu 3,28%; Frankfurt, 3,25%; Zurique, 2,16% Amsterdã, 3,62%, etc. A quebradeira continuou por todo o dia seguinte.
Este pessimismo é agravado pelas notícias do desempenho da economia dos EUA. O desemprego continua a crescer; as previsões de crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) foram reduzidas, de 3,5%, para 2,8%; o número dos bancos com problemas elevou-se para o mais alto nível dos últimos 16 anos, atingindo 552; 50 bancos já quebraram no terceiro trimestre deste ano e o Federal Deposit Insurance Corp. (FDIC), órgão que garante os depósitos bancários, determinou o fechamento de mais bancos, chegando a 124 o número de fechamentos só em 2009, nível mais elevado dos últimos 17 anos.
Na zona do euro, há sinais de recuperação, mas os analistas também demonstram preocupação. A taxa de desemprego subiu, de 9,5% em agosto, para 9,7% em setembro, patamar mais alto desde 1999; a valorização de 18%, do euro frente ao dólar ameaça as exportações do bloco; o ritmo de crescimento das encomendas da indústria caiu em novembro, em relação a outubro e o presidente do Banco Central Europeu (BCE), Jean-Claude Trichet, alertou que a economia deverá recuperar-se “gradualmente” em 2010. No outro lado do mundo, vários ministros do governo japonês pressionam o Banco Central exigindo uma intervenção mais dura para combater uma nova ameaça, a deflação.


Taxa de desemprego para a zona do euro - Nov.09 (***)

(*) Dados para o 3º trimestre de 2009
(**) Dados para o mês de setembro de 2009
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Neste ambiente, contraditoriamente, os dados apontam para uma retomada mais sólida em alguns setores da economia brasileira. Desta vez, parece que o ministro Mantega ainda continua mantendo a liderança na determinação das linhas da política econômica. A redução de IPI para os carros flex foi prorrogada até março de 2010. Os veículos com motores a gasolina seguirão a tabela progressiva já anunciada. Para os caminhões, a alíquota será zero até 30 de junho de 2010. Para os fabricantes de móveis, a alíquota também será zero até 31 de março do próximo ano e, para materiais de construção, até 30 de junho. Os produtos da linha branca também continuam com o IPI reduzido. Somadas as benesses, a renúncia fiscal será de R$ 25,66 bilhões apenas neste ano. O ministro promete ainda analisar a redução dos impostos para os materiais escolares e desonerar as folhas de salários das empresas.
Mas, a fúria do governo não fica por aí. O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) resolveu financiar a compra de caminhões e camionetes com juros de 2% ao ano, 10 anos para pagar e três de carência. Ao mesmo tempo, o ministro da Defesa anunciou a aquisição de 2.000 blindados de um novo modelo, o Guarani, para reequipar as forças armadas nacionais, a serem fabricados pela Fiat/Iveco, em Sete Lagoas (MG), e ao custo de US$ 1,5 milhão cada um.
No mercado de trabalho, também é comemorado o saldo positivo de empregos cujo número atingiu 933 mil até setembro. Lamentavelmente, destes novos empregos, 99,8% correspondem a salários até dois mínimos, dos quais 45% foram vagas de um salário mínimo. Entre os demitidos, 425 mil correspondiam a salários superiores a dois mínimos. Observa-se, portanto, uma certa degradação nos níveis de salários, o que pode ser justificado pela alta da participação da construção civil, que bateu recordes de admissão de novos trabalhadores.
No setor financeiro, continuando a política de bombeiro dos bancos oficiais, que durante a crise socorreram, com empréstimos, a Sadia e o banco Safra, o Banco do Brasil comprou o Banco Votorantim, e a Caixa Econômica adquiriu 49% do capital votante do Banco Panamericano, entregando R$ 750 milhões ao grupo Silvio Santos.
O desespero do governo para estimular a economia, a qualquer custo, antes das eleições, vemcomprometendo o superávit primário, antes, tão defendido por ele próprio como imprescindível ao bem da1,17%, para 1% do PIB, afastando-se ainda mais da meta que era de 2,5% para todo o ano. Por outro lado,o déficit nominal do setor público continuou crescendo, passando, de 4,29%, para 4,61% no mesmoperíodo. Neste caso, os juros da dívida são apontados como o maior responsável pelo aumento, apesar daqueda da taxa selic de 13,75% para 8,75%. 
E para completar a felicidade nacional, enquanto esperamos o “excelente Natal” prometido pelo presidente do Banco Central, H. Meireles, assistimos, em outubro, ao maior déficit do ano nas contas externas do país e ao desabamento do dólar ao menor patamar dos últimos 16 meses, enquanto nos envenenamos com as nossas emissões de gases estufa que aumentaram 62% nos últimos 15 anos.


Texto escrito por:
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do Progeb-Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira
Email: progeb@ccsa.ufpb.br


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Começando a refletir sobre as eleições presidenciais de 2010

Semana de 16 a 22 de novembro de 2009

A era FHC ficou conhecida como aquela em que se estenderam, para o Brasil, as chamadas políticas neoliberais. A partir do segundo mandato do governo Fernando Henrique Cardoso, com a quebra da âncora cambial, foi adotada a política de metas inflacionárias, marcada de um lado pelas elevadas taxas de juros e, de outro, pelos superávits primários astronômicos. Os juros foram elevados sob o argumento de que era necessário para controlar a inflação. Já os superávits primários, que consistem na economia que o governo faz para pagar os juros da dívida, aumentavam gradualmente para garantir aos especuladores financeiros que o governo teria condições de honrar com os compromissos assumidos, sempre crescentes.
Foi ao longo dos dois mandatos de FHC que foram feitas uma série de reformas que resultaram em uma menor intervenção do Estado, com conseqüências desastrosas para os problemas sociais e a distribuição de renda. Além disso, foram implementadas reformas regulatórias na economia, dando ao capital estrangeiro o mesmo tratamento do capital nacional e promovendo uma série de privatizações de empresas estatais, bem como a venda de empresas estatais, ou parte destas, ao capital internacional.
Paralelamente a este receituário de política econômica, assistiu-se a uma mudança na política social, que passou de uma estratégia de universalização para uma de focalização. Com isto, os direitos não seriam mais garantidos em constituição e a política descriminaria quem teria direito aos benefícios, escolhendo-se os mais “pobres dentre os pobres”, sendo todas estas mudanças indicadas (de forma compulsória) pelo Banco Mundial e pelo FMI.
Ao longo deste período (1994-2002), viveu-se, então, uma piora nas condições sociais e distributivas do país, que já não gozava de situação confortável. Assim, sob esta conjuntura, Lula assumiu o comando, em 2003, deixando todos que nele votaram, com a expectativa de que romperia a política até então utilizada.
Infelizmente, não foi o que ocorreu. Manteve-se a política econômica, com o agravante de que se aumentou a meta de superávit primário e se reduziu a meta de inflação, exigindo do governo um maior esforço fiscal, o que implicou em mais cortes na área social. Para se ter uma idéia, os juros da dívida interna, nos dois mandatos de FHC, totalizaram R$ 577,2 bilhões e, só no primeiro mandato de Lula, esta cifra ficou em R$ 590,6 bilhões, ou seja, somando tudo, pagou-se mais de R$ 1 trilhão em juros. Por sua vez, apesar do arrocho fiscal para pagá-los, a dívida cresceu em R$ 913,7 bilhões, já que o superávit alcançado foi de R$ 489,8 bilhões.
Infelizmente, não foi o que ocorreu. Manteve-se a política econômica, com o agravante de que se aumentou a meta de superávit primário e se reduziu a meta de inflação, exigindo do governo um maior esforço fiscal, o que implicou em mais cortes na área social. Para se ter uma idéia, os juros da dívida interna, nos dois mandatos de FHC, totalizaram R$ 577,2 bilhões e, só no primeiro mandato de Lula, esta cifra ficou em R$ 590,6 bilhões, ou seja, somando tudo, pagou-se mais de R$ 1 trilhão em juros. Por sua vez, apesar do arrocho fiscal para pagá-los, a dívida cresceu em R$ 913,7 bilhões, já que o superávit alcançado foi de R$ 489,8 bilhões.
No que se refere à política social, o governo Lula não se afastou muito do anterior. Pode-se dizer que as mudanças foram basicamente quantitativas, tendo em vista que apenas foram unificados os programas já existentes. Os programas como Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e o Cartão Alimentação (do Fome Zero) foram unificados num programa único denominado de Bolsa Família, cuja principal característica, em relação aos demais, é a sua abrangência, já que atualmente a quantidade de pessoas beneficiadas é muito maior.
Todavia, optou-se por uma política social de governo em vez de uma política social de Estado, pelo fato de ser mais barata, mais restrita, não precisar da garantia constitucional e, ainda vincular, ao gestor, um eleitorado fiel que, por ingenuidade, atribui o mísero valor recebido à benevolência do governante e não a um direito institucional.
Em poucas palavras, pode-se resumir que a base do governo de Lula assenta em dois amplos pilares: no primeiro está a política econômica, que garante rendimento ao capital financeiro; no segundo está o Bolsa Família, que transfere uma quantia quase que irrisória aos pobres dentre os pobres do país, liberando, aparentemente, o Estado de suas reais obrigações.
É preciso ainda levar em conta que a política econômica de elevados superávits primários e altas taxas de juros traz outros danos à economia do país. Além de elevar a dívida pública, pressiona a moeda nacional à valorização, já que atrai volume expressivo de capitais especulativos de curto prazo. Para se ter uma idéia do quanto o juro brasileiro é vantajoso ao especulador estrangeiro, um levantamento da FIESP mostrou que, de agosto de 2003 a outubro de 2009, a valorização do real frente ao dólar foi de 42%, enquanto a média mundial de valorização de outras moedas frente a moeda americana foi de 19%, ou seja, uma diferença de 23 pontos percentuais.
Esta sobrevalorização exacerbada, da moeda brasileira em relação ao dólar, tem contribuído para o aprofundamento do fenômeno denominado de “desindustrialização” ou “doença holandesa”, configurado pela constante perda de participação da indústria na economia do país. Há mais de uma década que o capital produtivo cede lugar ao capital especulativo, levando o Brasil à piora constante no ranking de competitividade. Várias são as indústrias que já abandonaram o país em busca de condições mais favoráveis para os investimentos. Além disso, é cada vez mais freqüente a importação de peças e componentes, em detrimento da produção nacional. Consequentemente, a indústria automobilística e de eletroeletrônicos passa a comprar peças e componentes importados, restringindo a atividade industrial do país à simples montagem dos produtos, com o desaparecimento de várias cadeias produtivas.
A conseqüência é a queda da participação dos produtos industrializados nas exportações do país. De acordo com Roberto Gianneti da Fonseca, diretor de comércio exterior da FIESP, essa tendência será mantida e aprofundada em 2010 caso o câmbio se mantenha no patamar de R$ 1,70, ao mesmo tempo em que a China não valorize sua moeda e as demais moedas continuem se valorizando frente ao dólar menos que o real. Gianneti destaca que a crise mundial contribuiu para a queda das exportações brasileiras, mas o câmbio tem uma forte influência no resultado. Para minorar os malefícios, ele defende uma taxa de câmbio entre R$ 2,00 e R$ 2,20.
Como o governo não pretende tomar medidas mais severas para conter a apreciação da moeda nacional, Lula já transmitiu sua mensagem aos empresários dizendo que a solução para problema é “evoluir tecnologicamente para ganhar dinheiro exportando, mesmo com o dólar mais barato”. Os empresários deveriam responder ao presidente que ficaria mais fácil aderir a sua proposta se a política econômica oferecesse as condições necessárias para tal, reduzindo o custo do investimento à níveis aceitáveis, (inclusive o custo da energia, que é um dos maiores do mundo) e dotando o país de infraestrutura de qualidade.
Assim, enquanto a prioridade do Banco Central consistir em remunerar o capital financeiro, é certo que a política econômica dificilmente mudará. O pior é que a justificativa empregada para o uso de tal política é a constante preocupação com o controle da inflação. De fato, embora não seja o principal fator, a valorização cambial contribui para este controle, já que, ao facilitar as importações, quebra o poder dos oligopólios nacionais.
Desta maneira, pode-se concluir que os dois partidos com chances de vitória nas urnas, no próximo ano, praticam a mesma política econômica e social. O que fazer então?
De fato, um governante que rompesse com a atual estrutura certamente seria condenando pelo próprio povo, que é manipulado pelos meios de comunicação convencionais comprometidos, por motivos diversos, com os interesses do capital financeiro.
Assim, se têm dois grandes desafios: o primeiro é conseguir conscientizar a sociedade brasileira que a saída, ou pelo menos, a melhora da situação atual, não se dará mantendo a equipe atual, nem tão pouco trazendo de volta a equipe que governou o país antes de Lula. O segundo desafio consiste em identificar que outro candidato ou partido é capaz de romper com o atual modelo, oferecendo uma alternativa capaz de melhorar a situação social e econômica do país.


Texto escrito por:
Águida Cristina Santos Almeida: Professora do Departamento de Economia e Finanças da Universidade Federal de Campina Grande - UFCG e integrante do PROGEB – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. 
Email: progeb@ccsa.ufpb.br


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