sábado, 1 de maio de 2010

Brasil e mundo: reanimação em descompasso

Semana de 19 a 25 de abril de 2010


À medida que a atividade econômica é mensurada, reafirma-se o cenário de recuperação da economia brasileira. Dados sobre o nível de estoques da indústria reforçam a tese de que o PIB poderá crescer 7,1% este ano. Cerca de 11% das empresas que participaram da Sondagem da Indústria, feita pela FGV, em março, informaram ter estoques insuficientes. Aliada a isto, a confiança do empresário industrial permanece elevada, segundo a Confederação Nacional da Indústria.
Tais fatos são confirmados pelo ritmo de expansão do PIB. A Serasa apurou, no 1º bimestre do ano, um crescimento de 7,3%, do PIB, impulsionado pelo aumento de 24,3% no investimento produtivo, de 10,5% no consumo e de 13,3% nas exportações. A previsão otimista não se limita ao âmbito interno. O FMI prevê crescimento do PIB, em 2010, de 5,5% e 4,1%, em 2011. Este crescimento, segundo o órgão, não será prejudicado pela alta valorização do mercado acionário interno, apesar da elevação do preço dos ativos e do aumento do crédito.
Além disso, a divulgação dos resultados de algumas empresas aponta para a nova fase do ciclo. No Brasil, a Coca-Cola vendeu 12% a mais, no primeiro trimestre deste ano, e no ramo da construção, as empresas esperam elevar as vendas em torno de 50%, até o final de 2010, em relação a 2008. No setor bancário, o Citigroup lucrou US$ 4,4 bilhões, US$ 2,84 bilhões a mais que no primeiro trimestre do ano anterior.
Enquanto os sinais da reanimação são sentidos, o governo se preocupa em regulamentar a ação dos bancos e operadoras do setor de cartões de crédito. O ingresso de mais de 30 milhões de novos consumidores, que migraram das classes D e E, para a C, entre 2002 e 2008, favoreceu o abuso das operadoras, principalmente na cobrança de tarifas que, nem mesmo as instituições conseguem justificar. Campeão de queixas no Procon, o setor é desregulamentado e o governo busca meios de fiscalização para evitar que este fácil acesso ao crédito, ao invés de estimular a economia, cause um superendividamento da população, contribuindo para abortar a reanimação econômica.
Para o mundo, o cenário é de incertezas. O grupo dos G-20 perde forças na discussão em torno dos efeitos da crise mundial à medida que os países-membros renascem para a nova fase. Decisões em relação à criação de um imposto mundial sobre os bancos e a definição de um mecanismo de avaliação para pressionar a China a valorizar sua moeda, ficaram estagnadas no último encontro que aconteceu em Washington. E por falar na China, sua economia continua crescendo a taxas elevadas. O PIB, no primeiro trimestre, cresceu em torno de 12%, enquanto que, no primeiro trimestre de 2009, cresceu 8,9%. Segundo analistas, o desaquecimento chinês é necessário porque já se verificam bolhas no mercado imobiliário e aumento excessivo da oferta monetária. Porém, será difícil convencer uma economia que gera US$ 4,9 trilhões a manter-se num cenário de austeridade, tendo de equacionar uma entrada de cerca de 10 milhões de chineses, por ano, na população economicamente ativa e, além disso, adotar um padrão cambial rigoroso.
Enquanto se propõe o desaquecimento do crescimento chinês, buscam-se, nos dados da economia americana, algum sinal da bendita recuperação. Classificados como “róseos” e certamente registrados no Livro Bege do Federal Reserve, os dados de março refletem uma possível reanimação: a venda de casas está em alta (aumentou em 7%), após três meses de queda; os pedidos de seguro desemprego estão em baixa (caíram em 24 mil); e a inflação está sob controle, já que o nível de preços no atacado subiu apenas 0,7%. Os analistas dizem que “a recuperação parece que vai continuar” e o presidente Barack Obama declara que as medidas adotadas pelo governo interromperam a queda livre do setor imobiliário. E é aí que reside o grande problema: será que a recuperação é sustentável, já que os incentivos fiscais só terminam no segundo semestre? Uma grande dúvida paira sobre a economia americana.
Este é o nível de questionamento em relação à nova fase do ciclo econômico: a reanimação é sustentável? Ao contrário das outras fases do ciclo econômico que vêm disfarçadas sob várias nomenclaturas (depressão, contração, retração, recessão, desaceleração, desaquecimento, turbulência...), esta fase (a de reanimação, recuperação) é facilmente aceita e aplaudida pelos analistas e comentaristas econômicos. O fato é que, o Brasil está saindo na frente. Isto é o que os números nos dizem, mas não iremos longe sem o suporte mundial.

Texto escrito por:

Rosângela Palhano Ramalho: Professora do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do PROGEB - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.

domingo, 25 de abril de 2010

Será?

Semana de 12 a 18 de abril de 2010


Caro leitor, os números não mentem. O país está se recuperando da crise. A taxa de desemprego já é menor do que no pré-crise (7,1%), a produção industrial atingiu um índice de 126,57 pontos (2002=100) e as vendas no varejo alcançaram 167,36 pontos (2003=100).Dados como estes fazem analistas acreditarem que a economia crescerá em torno de 2%, do último trimestre de 2009, para o primeiro trimestre de 2010, o que corresponderia a uma taxa anualizada de 8,4%. Há quem diga, como o economista chefe da consultora Convenção, Fernando Monteiro, que o PIB vai crescer 7,1%. Já o economista chefe do J. P. Morgan, Fábio Akira, argumenta que, se confirmada essa variação positiva de 2%, o crescimento será de 6,5%. Este é o teto previsto pelo IPEA, que aponta como piso o mesmo valor, o que é também referendado pelo projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias. Um dos diretores do IPEA, João Sicsú, afirmou que o consumo das famílias e o aumento do emprego, da renda e do crédito servirão como motor deste crescimento. Sicsú apresentou esta previsão ao justificar o erro de previsão cometido pelo Instituto, em 2009, quando previu uma taxa de crescimento do PIB entre 0,2% e 1,2%. Na verdade esta taxa mostrou um decrescimento de -0,2%).
Tudo isso é reflexo das condições de produção e circulação dos produtos no mercado interno, visto que neste ano o saldo comercial já é 65,7% menor do que no ano passado. A média diária de exportações e importações, entre janeiro e abril de 2010, ante o mesmo período de 2009, cresceu 25,4% e 38,1%, respectivamente.
Apesar do fim da redução do IPI, o levantamento da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica afirma que 82% das empresas aumentaram suas vendas e o número de empregos atingiu 165,2 mil postos (nível pré-crise). A expectativa é de que o crescimento seja 11% maior do que o de 2009. Já a Associação Nacional dos Fabricantes de Eletroeletrônicos prevê que, mesmo com o fim do estímulo fiscal, ocorrerá um crescimento de 20% de encomendas no varejo, sendo que na linha branca esse aumento será de 25%, no primeiro trimestre de 2010, quando comparado com 2009. Já o Instituto Nacional de Distribuição de Aço, registrou um crescimento de 34% nas vendas de aço plano, no primeiro trimestre de 2010, quando comparado com o mesmo período de 2009. No setor têxtil a aposta é de crescimento de 4% a 5% em 2010.
Em conjunto com isso temos o aumento do número de horas pagas na indústria, que cresceu 1,5%, entre fevereiro e janeiro de 2010. No bimestre a alta foi de 0,7%. Isto denota que, antes de investir em expansão da capacidade produtiva, os empresários preferem aumentar a jornada, diante das perspectivas incertas quanto à robustez da atual recuperação. A Fiat, por exemplo, bateu o recorde de vendas de automóveis no início deste ano, com um total de 167,5 mil veículos, ante a cifra de 155 mil, em 2008. Mas, a produção da montadora até aqui ficou longe dos 190,3 mil carros produzidos em 2008, com um total de 171,8 mil em 2010. Isso é atribuído à antecipação do consumo, causada pelo IPI zero. "Para diminuir o uso de horas extras, que chegou a 52 horas semanais, segundo avaliação do Sindicato dos Metalúrgicos de Betim, a Fiat fechou no mês passado um acordo para admitir mil empregados definitivos até o fim de maio" (Valor Econômico, 13/04/2010).
O que dizem alguns é que esta cautela tem fundamento. O National Bureau of Economic Analysis (NBER), responsável pela datação do ciclo econômico norte americano, afirma que é muito cedo para comemorar o fim da depressão naquele país. Para ele "embora muitos indicadores tenham melhorado, ... seria prematuro afirmar que os dados já chegaram ao fundo do poço". O NBER define recessão como "uma redução significativa na atividade econômica por um período sustentável. O declínio seria visível no PIB, no mercado de trabalho, na produção industrial, no comércio e nos salários". São visíveis os motivos dessa preocupação: a economia conseguirá andar sem segurar a mão do governo? Lembremos que o BNDES aumentou em 37% o desembolso de recursos, atingindo R$25,497 bilhões, sendo que destes, R$9,9 bilhões (40%) foram para a infraestrutura (PAC) e R$7,7 bilhões para a indústria (30%).
Diante dos fatos, o que dizer da superação da crise? Será só imaginação? Será que nada vai acontecer? Será que tudo isso é fogo de palha?
Nos próximos meses saberemos as respostas.


Texto escrito por:

Lucas Milanez de Lima Almeida: Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB, Mestrando em Economia pelo CME-UFPB e membro do Progeb.