quarta-feira, 26 de setembro de 2012

“Guerra cambial”, o retorno


Semana de 17 a 23 de setembro de 2012


Eric Gil Dantas [i]




Em 2010, assistimos o primeiro capítulo da saga da “guerra cambial”, quando o Federal Reserve (FED), banco central estadunidense, injetou US$1,725 trilhão na economia dos EUA. Agora, no retorno desta guerra, o FED não está sozinho.Na artilharia de frente temos o reforço da terceira maior economia do mundo. O Banco do Japão (BoJ) se tornou o mais recente BC a afrouxar a política monetária, com um programa de compra de ativos que deverá adquirir 80 trilhões de ienes (US$1 trilhão), para ajudar a moribunda economia nipônica.
Além destes dois BCs, outros dois são aguardados para compor a frente de combate: o Banco Central Europeu (BCE) e o Banco da Inglaterra. O BCE disse, no início do mês, estar preparado para comprar títulos dos países da zona do euro que precisem de ajuda para controlar seus custos de captação. O anuncio das medidas de estímulo a serem tomadas pelo BC britânico é também aguardado para breve.
Aqui, o contra-ataque já foi armado. O governo brasileiro tomou medidas para evitar que as possíveis ondas resultantes do afrouxamento do FED contribuam com a valorização do real, promovendo os chamados swaps cambiais reversos. Além disto, Mantega já voltou a atacar o QE3 em entrevista ao Financial Times. No Peru, já foram acionadas estratégias para também desvalorizar sua moeda, o sol peruano. Já a Turquia anunciou corte maior do que o esperado, nos juros.
Este novo capítulo demonstra que a crise global ainda está forte. O economista estadunidense Joseph Stiglitz, prêmio Nobel em 2001, declarou em entrevista que a crise está longe de acabar. Ele lembrou que parte da população americana ainda tem dificuldades para encontrar emprego em tempo integral, ocupando-se apenas com empregos periódicos, o que esconde uma situação ainda pior do que os 8% de taxa oficial de desemprego. A isto somamos a queda da produção mensal na indústria dos EUA de 1,2% em agosto, a maior queda desde março de 2009, e a queda de 1% na utilização da capacidade instalada da indústria.
Na zona do euro, o Índice dos Gerentes de Compras (PMI) Composto – que agrega dados do setor industrial e de serviços – caiu para 45,9 em setembro, ante os 46,3 pontos de agosto, segundo a Markit Economics, indicando contração (por ser menos que 50 pontos). É o ritmo mais acelerado de declínio desde junho de 2009.
A China e o Japão também mostraram enfraquecimento. O indicador antecedente da atividade industrial do HSBC sugere que o setor deve se contrair, aumentando os sinais de que a economia chinesa está desacelerando pelo sétimo trimestre consecutivo. No Japão, as vendas externas recuaram 5,8%, o terceiro declínio seguido, o que fez o país ter mais um déficit comercial. Além disto, os embarques para a Europa caíram mais de 20% e para a China cederam quase 10%.
No Brasil, as incontáveis desonerações feitas pelo governo parecem aliviar um pouco os estoques da indústria, fazendo-os recuar 0,5% em agosto, ante julho. Bráulio Borges, economista-chefe da LCA, já prevê alta entre 1,5% e 2% para a indústria em agosto. Esta declaração encorpa as projeções do Ministério da Fazenda, que já estima uma aceleração do PIB nos dois últimos trimestres de 2012, com o crescimento de 1% e 1,3% no terceiro e quarto trimestres, respectivamente, o que faria o PIB de 2012 fechar com um crescimento de 2%.
Mas, o que ocorrerá quando se esgotarem os estoques que estavam empilhados em seus armazéns? Com esta conjuntura internacional adversa, será que os capitalistas irão investir? Em uma economia globalizada, como a do século XXI, nenhum país sairá da crise isoladamente sem a companhia dos demais.
O único efeito que talvez seja permanente, com esta política de isenções fiscais, seja a precarização, ainda maior, da Previdência Social. A partir de 2013, cerca de 40 setores deixarão de pagar contribuição previdenciária de 20% sobre a folha de pagamento.
            Agora é só esperar o discurso de que o aposentado é o problema do Brasil.


[i] Economista e pesquisador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira (progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Ministro conta piada e cai do cavalo


Semana de 10 a 16 de setembro de 2012


Nelson Rosas Ribeiro[i]




A piora da situação internacional, finalmente, está provocando a ação drástica das autoridades responsáveis pelas políticas monetárias e fiscais dos governos de todo o mundo.
Nos EUA, o Federal Reserve (Fed), banco central americano, decidiu intervir novamente, no mercado, sob a forma de um novo “afrouxamento monetário” (quantitative easing), o QE3. Isto significa que vão imprimir mais dólares para “aumentar a liquidez do mercado”. O Fed pretende retomar a compra de títulos podres até um montante de US$ 40 bilhões, por mês, sem prazo definido para terminar, ou melhor, até que o “mercado” se recupere.
E não ficou só. O Banco Central Europeu (BCE), vencendo a resistência dos conservadores alemães, também passará a intervir no mercado comprando títulos das dívidas soberanas dos países mais necessitados, os pigs, em primeiro lugar. Com isto pretende dar credibilidade aos títulos e assim reduzir os juros pagos pelo financiamento dessas dívidas, no “mercado”, é claro. O grande empurrão para isto foi a decisão da Corte Constitucional da Alemanha, que aprovou a criação do European Stability Mechanism (ESM), fundo de emergência temporário destinado ao socorro aos mais necessitados. Este fundo disporá de €$ 500 bilhões para cumprir sua missão. Mas o problema europeu não está resolvido com isto. Comenta-se que, destes 500, €$100 bilhões estão comprometidos com o socorro aos espanhóis, restando apenas €$400 bilhões para todo o resto, incluindo a Itália. A pior notícia, porém, vem das previsões sobre o crescimento do Produto Interno Bruto (PIB), feitas pelo BCE. Segundo estas, o “crescimento”, para 2012, será negativo, entre 0,2% e 0,3%. Para 2013, o BCE prevê entre, 0,3 negativos e 1,4% positivos. Os leitores sabem que o “crescimento negativo”, para os economistas, é mesmo DECRESCIMENTO. O desespero atinge todos os BCs do mundo e o lamento é geral: os manuais de economia não estão fornecendo as respostas para superar a crise. Apesar de não haver declaração explícita, nas entrelinhas, torna-se evidente que todos admitem que ela é de superprodução, e o que se pretende é provocar o aumento da demanda, quer das empresas, dos governos ou das famílias. Já há quem defenda que, para obter este resultado, todas as soluções são válidas, mesmo as mais radicais simbolizadas no “jogar dinheiro de helicóptero”.
Apesar dos esforços do governo Dilma, esta situação está tendo fortes repercussões, no Brasil. Mesmo aparentando haver certa tranqüilidade, no mercado de trabalho, a produção industrial está estagnada, alguns setores demitem, o crédito é limitado, etc. As preocupações do governo cresceram ao ponto de conduzir o teimoso ministro Mantega a rever as suas previsões para o crescimento do PIB, deste ano. No final do ano passado, o ministro afirmava que o crescimento deveria chegar perto dos 5%. Já em janeiro, quando o mercado calculava em 2,9%, Mantega reduziu suas previsões para algo entre 4,0% e 4,5%. A partir de junho, o BC já calculava o número em 2,5%, sob as críticas do ministro de que os cálculos estavam mal feitos e ele acreditava que superaríamos os 2,7%, de 2010. E quando o Banco Credit Suisse estimou em 1,5% a taxa, Mantega considerou-a “uma piada”. Logo depois o ministro passou a fixar seu número mágico em 3%. Finalmente Mantega caiu do cavalo, ou melhor, caiu na real. Reduziu sua previsão, de 3%, para 2%, quando o mercado já as estima rigorosamente em 1,62%. Onde está a piada?
A solução, agora, é correr contra o prejuízo. Está justificado assim, o pacote de bondades com que o governo presenteia o setor empresarial: prorrogação das reduções de impostos, desoneração das folhas de pagamento, mesmo a custa do “rombo da previdência”, (que ninguém fala), redução dos juros, liberação de linhas de financiamento, redução das tarifas de eletricidade, etc. Justifica-se a irritação da presidente Dilma, com as críticas do “mercado” e de algumas empresas do setor elétrico, que reagiram mal ao novo plano de redução das tarifas que, convenhamos, beneficia a todos.
            Haja ingratidão!


[i] Professor do departamento de Economia, Coordenador do Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira progeb@ccsa.ufpb.br); (www.progeb.blogspot.com).