Semana de 05 a 11 de junho de 2017
Antonio Carneiro de Almeida Júnior [i]
Ainda não se pode afirmar com certeza se o
crescimento de 1% do Produto Interno Bruto, PIB, no primeiro trimestre de 2017,
marca o início da recuperação da economia brasileira, que vem sendo dilacerada
por grave crise nos últimos anos. Contudo, já começam a se delinear as
características dessa recuperação: as bases da retomada não se encontram no
mercado interno, mas sim no externo, ou seja, é o resto do mundo que nos vai
“tirar do buraco”.
Quando se analisa a contribuição dos
setores ao crescimento do PIB trimestral supracitado, é notável a que foi dada
pelo setor agrícola, que cresceu 13,4% no mesmo período, de acordo com o
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, IBGE. Tal expansão de oferta,
contudo, não teve por objetivo atender à demanda interna. Ainda de acordo com o
IBGE, o consumo das famílias continua caindo, embora a um ritmo bem mais lento:
0,1% nesse primeiro trimestre. Já não se pode dizer o mesmo com desempenho das
exportações: elas aumentaram 4,8% no mesmo período. Neste cenário, a MCM
Consultores estima um crescimento de 21,59% do saldo do balanço comercial, em
2017, o que fecharia o ano em US$58 bilhões. Já o saldo da conta corrente, que
além da balança comercial, engloba o fluxo de rendas entre Brasil e resto do
mundo, deve atingir no final do ano um déficit de US$23,5 bilhões. Estima-se
que tal déficit, contudo, seja coberto pelo Investimento Estrangeiro Direto com
folga.
Analisando inicialmente apenas a situação
da conta corrente, embora a saída de renda do país mais que compense o saldo
positivo no balanço comercial, teoricamente, o impacto positivo do setor
exportador no PIB é superior ao impacto negativo da fuga de renda, uma vez que
o primeiro estimula o investimento, alavancando outros setores da economia,
algo que já vem ocorrendo.
O bom desempenho da agricultura se refletiu
na indústria, com a venda de máquinas agrícolas alcançando 17.262 unidades nos
cinco primeiros meses desse ano, um quantum 28,7% maior que o atingido em igual
período de 2016. Não é à toa que o setor automobilístico e o setor de máquinas
e equipamentos, a despeito do seu comportamento errático, cresceram,
respectivamente, 3,4% e 4,9%, entre março e abril desse ano, constituindo dois
dos quatro principais responsáveis pelo crescimento de 0,6% da indústria nesse
mesmo período. É oportuno comentar ainda que, com o real bastante desvalorizado
frente ao dólar, não apenas a exportação de commodities, mas também a de outros
tipos de mercadorias vem experimentando um bom desempenho no presente ano. De
janeiro a maio, o setor automobilístico, por exemplo, obteve uma receita de exportações
de US$5 bilhões, um crescimento de 57,2% em relação ao mesmo período do ano
passado. Caso o ritmo se mantenha, com mais três meses, o setor exportará a
quantidade de veículos prevista para todo o ano.
Quando passamos a considerar o ingresso de
investimento direito no país, a contribuição dada pelo setor externo torna-se
ainda mais clara. Em primeiro lugar, é certo que pelo menos uma pequena parte
desses recursos advindos do exterior constituirá um aumento do estoque de
capital do país, seja porque de fato serão criados novos empreendimentos, seja
porque as empresas destinarão parte dos recursos captados com a venda de ações
para investimento. A outra parte, por sua vez, mesmo que se transforme apenas
em renda, servirá de contrapeso para o saldo negativo do balanço de rendas. Ou
seja, de uma maneira ou de outra, o setor externo estará agindo no sentido de
empurrar a recuperação da economia.
Desta forma, frente às medidas restritivas
que vem sendo tomadas pelo governo Temer e de outros fatores internos que
impedem que mecanismos endógenos provoquem a retomada da economia brasileira,
estando esta ligada indissoluvelmente ao movimento cíclico da economia mundial
pelo fenômeno que conhecemos como globalização, tal retomada será certamente
patrocinada pela poupança externa. Contudo, a entrada de recursos no país pela
conta financeira do balanço de pagamentos, ao passo que pode contribuir para a
elevação da atividade econômica, tem como contrapartida uma elevação da renda
líquida enviada ao exterior em um futuro próximo, seja sob a forma de juros de
dívida ou de remessa de lucros, o que perpetua e amplifica a situação de
dependência da economia em relação aos países centrais.
[i] Professor
Substituto do Departamento de Relações Internacionais da UFPB e pesquisador do
Progeb – Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
(www.progeb.blogspot.com).