Semana de 10 a 16 de fevereiro de 2014
Rosângela Palhano Ramalho
[i]
Em agosto de 2013, esta coluna anunciou que as revisões
para baixo nas previsões de crescimento do PIB dos emergentes determinaram o
fim do prestígio deste grupo de países frente à sua participação na elevação do
crescimento mundial. E 2014 chegou para selar o destino dos emergentes. O
“tapering” do Federal Reserve (Fed), banco central dos EUA, está, conforme o
esperado, gerando problemas financeiros em diversos países do mundo,
estimulados principalmente pelas especulações realizadas no mercado cambial.
Brasil, Índia, Indonésia, África do Sul e Turquia, agora
reunidos em um grupo batizado de BIITS sendo os mais afetados pela decisão
norte-americana de reduzir os estímulos monetários, são agora enquadrados como
frágeis, vulneráveis. Suas vulnerabilidades estão resumidas num indicador
construído pelo Fed e calculado para uma amostra de 15 economias emergentes. O
índice de vulnerabilidade apurado se correlaciona com as persistentes
desvalorizações cambiais dos países estudados. A conclusão faz parte de um
relatório divulgado pela equipe gestora do Fed, na pessoa de sua nova
presidente, Janet Yellen. Neste relatório o Brasil aparece como o segundo mais
vulnerável do BIITS, perdendo apenas para a Turquia.
As conclusões do tal relatório causou um mal-estar tão
grande na equipe econômica brasileira, que a direção do Banco Central entrou em
contato com o Fed para esclarecer que esta posição sobre o Brasil está
defasada. Os próprios “investidores”, segundo o governo, admitem as diferenças
entre os emergentes, e em especial, entre o Brasil e a Turquia. A equipe
econômica, que no Fórum Econômico Mundial em Davos, já havia rejeitado a “crise
da meia-idade” dos emergentes, rejeita também esta comparação. Afirma que o
Brasil está muito à frente da Turquia quanto se consideram os aumentos
sucessivos nas taxas de juros e o montante de reservas cambiais (US$ 370
bilhões) que são, segundo o governo, mais que suficientes para atravessar as
turbulências financeiras.
Além da contestação oficial, destacaram-se as declarações
de economistas renomados que passaram também a rejeitar a ideia da crise
generalizada nos emergentes e de comparação entre eles. Murilo Portugal, por
exemplo, classificou de “totalmente absurda a comparação do Brasil com a
Turquia” e Delfim Netto chamou de “paranoia absurda” as conclusões do relatório
do Fed.
Não precisamos ser economistas renomados para perceber
que a contaminação pela desvalorização cambial seria uma das consequências da
decisão do banco central americano e que os emergentes deveriam ajustar suas
políticas internas à nova situação, sendo obrigados a elevarem a taxa de juros
para defender as suas moedas. Mesmo assim, o futuro dos emergentes parece muito
mais agradável. Segundo o FMI, os países emergentes cresceram 4,7% em 2013 e
crescerão 5,1% em 2014, enquanto que o mundo desenvolvido cresceu 1,3% em 2013
e crescerá 2,2% em 2014.
À espera de melhores dias para todos, o presidente do
Banco Central indiano, Raghuram Rajan, ainda em Davos, clamou de forma ingênua:
“Os países industrializados têm de desempenhar um papel na restauração (da
cooperação mundial) e a essa altura não podem simplesmente lavar as mãos e
dizer que farão o que precisam fazer e os outros que se ajustem.”
Em contrapartida, esta semana, na primeira sabatina
frente ao Congresso americano, a presidente do Fed, limitou-se a dizer que o
banco central persegue a estabilidade de preços e o máximo emprego e garantiu
que a política americana seguirá o curso prometido a não ser por uma piora dos
indicadores americanos, é claro. Ainda segundo Yellen, as vulnerabilidades dos
BIITS, não são reflexos apenas das reduções das compras de ativos do Fed, mas
sim de uma série de outros fatores intrínsecos a estas economias.
De forma clara a resposta ao clamor de Rajan foi dada:
cada um que trate de domar a sua crise. O curioso é que quando os Estados
Unidos tomam decisões que afetam os outros, é só uma questão de defesa interna.
Mas quando os “vulneráveis” se defendem são acusados de intervencionistas extremos
que comprometem os ajustes necessários e que impedem o melhor funcionamento da
economia.
Será apenas uma questão de ponto de vista?
[i] Professora
do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto
Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)