sexta-feira, 9 de julho de 2010

Os Paradoxos da Recuperação

Semana de 28 de junho a 04 de julho de 2010


As notícias sobre o nível de atividade econômica mundial continuam tomando conta da maioria dos jornais. O assunto, de tanto ser repetido, já se tornou comum e muitas vezes cansativo para os leitores. Infelizmente, abordá-lo-emos mais uma vez neste artigo, por se tratar de um processo lento e conturbado, que se encontra em plena evolução seguindo direções incertas e caminhos tortuosos. Com efeito, alguns fatos parecem apontar para a reanimação da economia mundial, criando entusiasmo nos mais otimistas. Outros continuam a indicar o aprofundamento, ou pelo menos o prolongamento da crise econômica. Em mais uma semana, as notícias mostraram exatamente isto, com as montadoras de automóveis dos Estados Unidos aumentando a produção, mas, no México. Durante a crise, o governo Obama gastou mais de US$ 80 bilhões para sustentar e salvar a GM e a Chrysler. Uma vez estabilizadas, elas projetam um aumento da produção de carros, no entanto, alegando a necessidade de redução dos custos de produção, estes recursos foram transferidos para investimentos no país vizinho.

Os números da economia dos Estados Unidos, por outro lado, também sugerem uma perda de fôlego na recuperação. Os pedidos de seguro desemprego aumentaram em 13 mil, contrariando as expectativas que eram de queda desse indicador. A geração de postos de trabalho no país também frustrou as expectativas. Em junho, foram criados apenas 13 mil empregos, número muito abaixo do esperado, que era de 60 mil.

A Europa continua passando por um período de elevada instabilidade. Na Grécia, está sendo estudado um congelamento nos salários do setor privado por três anos. Com isso, o clima de insatisfação e descontentamento continua se refletindo em grandes protestos e manifestações de trabalhadores.

Na Alemanha, a taxa de desemprego caiu de 7,7% em maio, para 7,5% em junho, refletindo um moderado crescimento de sua economia. Já a Irlanda, por sua vez, anunciou “oficialmente” a saída da recessão no primeiro trimestre de 2010, quando a economia do país cresceu 2,7% em relação ao trimestre anterior. Esta foi a primeira vez que a economia do país apresentou crescimento, depois de dois anos de contração. A evolução destes dados, entretanto, não é suficiente para permitir a retomada da economia desses países, indicando apenas um intervalo no período de instabilidade, que ainda não terminou.

Até mesmo a China apresentou uma desaceleração em sua atividade industrial, puxando para baixo o mercado asiático. O índice de gerentes de compra da indústria chinesa caiu de 52,7 pontos em maio, para 50,4 em junho. Os analistas de mercado estão preocupados ainda com um possível estouro da bolha imobiliária chinesa, o que poderia desencadear fortes efeitos negativos sobre toda a economia. A agência nacional de estatísticas da China informou que a desaceleração do índice oficial reflete a política monetária mais dura do governo

No Brasil, o aquecimento do mercado vem levando algumas empresas a contratação de novos trabalhadores. A fábrica da Ford, em São Bernardo do Campo, anunciou a instalação de uma nova linha de motores, dobrou a capacidade de produção e, além disso, contratou 200 trabalhadores horistas, cuja jornada de trabalho varia de acordo com a produção.

O desenrolar do processo de recuperação, portanto, continua marcado pela instabilidade e pela incerteza, e a sucessão dos fatos apresenta um histórico recente de paradoxos grandes o suficiente para levar os mais otimistas a projetarem um breve retorno do crescimento da economia mundial, enquanto, do outro lado, os mais pessimistas formulam previsões de um cenário de aprofundamento da recessão, com a turbulência nos países europeus.

O fato é que esse episódio do ciclo econômico atual ainda está longe de acabar, prometendo revelar novos fatos paradoxais.


Texto escrito por:

Diego Mendes Lyra: Mestrando em economia, Professor Substituto do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb – Projeto globalização e crise na economia brasileira.


terça-feira, 6 de julho de 2010

As Formas de Manifestação das Contradições Internas do Capitalismo

Semana de 21 a 27 de junho de 2010


Os agentes econômicos continuam preocupados com a trajetória da economia mundial, visto que a situação na Europa permanece tensa. Uma compilação feita pelo Royal Bank of Scotland aponta que os empréstimos fornecidos pelo Banco Central Europeu cresceram € 332 bilhões desde junho de 2008. O que chama atenção é que 68% deste aumento, ou seja, € 225 bilhões, consiste em empréstimos a bancos da Grécia, Portugal, Irlanda e Espanha. Diante deste cenário, a preocupação com a austeridade fiscal fez o rendimento dos títulos gregos com prazo de 10 anos subir mais de um ponto percentual nesta semana, atingindo 10,42%. Os rendimentos dos títulos de Portugal e Espanha, por sua vez, subiram para 5,70% e 4,5% respectivamente, estando, este último, meio ponto percentual acima do patamar alcançado durante a turbulência financeira ocorrida em 10 de maio passado.
Nos Estados Unidos, a venda de imóveis usados, também em maio, caiu 2,2% em relação a abril, mesmo com os analistas esperando um aumento de 6%. Desempenho consideravelmente pior foi constatado nas vendas de imóveis novos, que caíram 33% no mesmo período, quando os analistas esperavam uma queda de 20%. Sabendo que os incentivos estatais para compra de imóveis duraram até abril, a magnitude da queda nas vendas aponta para o fato de que a destruição de capitais neste setor apenas foi adiada pelo governo norte-americano.
Um problema que passa despercebido, entretanto, é que esta situação da economia mundial serve de justificativa ao aumento da exploração da força de trabalho. Um indicador econômico que se presta muito bem à mistificação deste fenômeno é a produtividade do trabalho, visto que é comumente calculado apenas dividindo o que foi produzido pelo número de trabalhadores ativos. Mas, os entusiastas deste indicador, maliciosamente, nunca consideram o ritmo de trabalho ou a quantidade de horas trabalhadas por cada trabalhador, o que permitiria diferenciar aumento de produtividade e aumento de intensidade do trabalho.
Na economia brasileira, por exemplo, nos 12 meses encerrados em abril deste ano, a indústria teve um aumento de 4,2% no que se chama de produtividade. A credibilidade desta estatística, todavia, é colocada em xeque quando se analisa a evolução dos índices de horas trabalhadas e pessoal ocupado na indústria durante o mesmo período. Segundo pesquisas do IBGE e da CNI, enquanto o primeiro evoluiu, de 97,5, para 105,6 (com um pico que atinge 109,8 em março), o segundo (tendo o último valor como pico) passou de 99,46 para apenas 102,78. Claramente se observa, portanto, que o chamado aumento de produtividade, na verdade, esconde uma jornada de trabalho cada vez mais árdua para os trabalhadores. Para piorar a situação, a resposta dos trabalhadores via organização sindical conseguiu aumentos reais de salário de apenas 1,9% neste período. Se tal cenário se desenha em um dos países em melhor situação frente à crise, imagina-se como deve estar a situação do resto do mundo.
Na China, o aumento da dominação das relações capitalistas na economia, que têm como efeito colateral o aumento da organização da classe operária, tem gerado uma série de greves. A maior operação da Toyota, depois de três dias de paralisação, só foi reaberta na segunda-feira, dia 21, após acordo com trabalhadores de uma fabricante de autopeças. Entretanto, no dia seguinte, a companhia foi novamente forçada a fechar duas linhas de montagem em virtude de novas greves nos seus fornecedores. Já a Honda, devido às greves dos seus trabalhadores, foi obrigada a aumentar os salários em até 24%. Após este reajuste, o salário anual do trabalhador chinês passou à faixa que varia entre US$ 4.500 e US$ 5.500, quase o dobro do salário médio de um operário indiano e 33% maior que o de um operário tailandês. Assim, os mesmos fatores que levaram várias companhias a migrarem para a China farão com que estas migrem para outros países. Resta-nos saber o que acontecerá quando não houverem mais trabalhadores desorganizados em países de terceiro mundo que se submetam aos altos níveis de exploração que têm sido praticados.
Vemos, portanto, que a ocorrência no cenário da economia mundial, de acontecimentos como tensão nos mercados financeiros, destruição de capitais e conflitos de classe, permite claramente a observação das formas de manifestação das contradições internas do Modo de Produção Capitalista na atualidade.


Texto escrito por:

Antonio Carneiro de Almeida Júnior: Economista, Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Econômico da UFPR, PPGDE/UFPR, e pesquisador do PROGEB - Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira.
Email: progeb@ccsa.ufpb.br