sábado, 15 de outubro de 2011

O “Prêmio Nobel de Economia”

Semana de 03 a 09 de outubro de 2011

Lucas Milanez de Lima Almeida [i]

Thomas J. Sargent e Christopher A. Sims foram laureados com o Prêmio SverigesRiksbank de Ciências Econômicas em Memória de Alfred Nobel, ou, como é conhecido, “Prêmio Nobel de Economia”. Suas pesquisas se concentraram na identificação da relação de causa e efeito entre as políticas econômicas e a atividade econômica. Segundo o comunicado, eles “desenvolveram métodos para as numerosas perguntas sobre as relações de causalidade entre a política econômica e diferentes variáveis macroeconômicas como o PIB, a inflação, o emprego e os investidores”. Este título, porém, é concedido pelo Banco Central Sueco e a premiação é paga por ele. Isto porque o “Prêmio Nobel de Economia” não é reconhecido pela Família Nobel, que desde 1968, proibiu a criação de outros “Prêmios Nobel” de áreas que não foram criadas pelo próprio Alfred Nobel.

Voltando ao Prêmio de Economia de 2011, podemos encontrar nas pesquisas de Sargent e Sims teorias acerca da influência do governo sobre a economia. Dentre as possíveis medidas de política econômica (que fazem parte do conjunto de influências), existem as chamadas políticas anticíclicas, que têm como função, atualmente, eliminar os efeitos da crise econômica sobre os principais problemas macroeconômicos: desemprego, inflação, dívida pública, etc. Mas disto a gente já sabe. Sabemos também qual o efeito causado por tais medidas: o déficit estratosférico dos EUA e dos PIIGS. Além disso, alertamos para a possível catástrofe que a ajuda dos Estados, por meio de outros Estados, pode causar.

O fato para o qual queremos chamar a atenção agora é o de que, apesar de toda intervenção, o Estado capitalista não tem a capacidade de eliminar os efeitos das leis do sistema, pois não age sobre suas causas. Mas nem poderia, caso contrário estaria eliminando o próprio capitalismo.

No modo de produção em que vivemos, a circulação da riqueza se distingue das anteriores, dentre outras coisas, pelo objetivo final da produção. A humanidade se organizou espontaneamente, de várias formas, para produzir e distribuir suas riquezas e, até antes do nascimento do capital, todas estas formas visavam a manutenção dos próprios indivíduos.

Mas, graças ao desenvolvimento do conhecimento científico, se tornou possível ao homem se manter sem se preocupar com a reprodução da espécie. O capitalismo surgiu deste contexto, na medida em que a produção e a circulação das riquezas deixaram de ter como objetivo a satisfação dos indivíduos e passaram a depender da obtenção, ou não, de lucro, juros e rendas. A essência da circulação da riqueza, desde a Revolução Industrial, é a apropriação privada do que podemos chamar de valor. É o valor sob a forma de lucro, dividendos, juros, etc. que move o mundo, desde então. Exemplo disto é a quase falência da General Motors, que, no início da crise atual, pretendia fechar suas portas, não por produzir veículos de má qualidade, mas porque a produção dos veículos deixou de ser lucrativa.

Além disso, é também o valor quem determina o comportamento das pessoas, já que é por meio delas que os fenômenos econômicos se manifestam (se não fosse através do capitalista, o investimento e o capital não poderiam existir). O desespero atual dos banqueiros e dos “analistas do mercado” diante da possibilidade de calote dos Estados e a perda do hospedeiro para parasitar é também exemplo disto. Para completar nosso quadro, dentre outros determinantes, quem detiver maior parte da substância motora da ação humana, a riqueza, terá também maior parte do poder político. Sendo assim, não podemos esperar que o Estado acabe com as características do sistema atual, pois ele é um reflexo do domínio econômico. Pelo contrário, ele vai fazer de tudo para que a situação se mantenha a mesma, já que os governantes querem se manter no poder. Isto foi o que vimos na reação dos governos diante da crise: aumento de impostos, redução dos salários, empréstimos às empresas, etc.

Mas, não é simplesmente uma questão do Estado querer mudar a economia. Na realidade a produção e a distribuição de riqueza são atos sociais, só ocorrem por meio da cooperação/divisão do trabalho. Isto torna os indivíduos parte de uma engrenagem que determina seu comportamento e que existe antes mesmo deles nascerem.

Caso a sociedade, como um todo, não mude a forma como produz e distribui sua riqueza, ou seja, mude as relações de produção, as mazelas enfrentadas por todos nós serão as mesmas e nem todos os ganhadores do “Prêmio Nobel de Economia”, juntos conseguirão alterar os resultados.



[i] Mestre em Economia, professor do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb. (www.progeb.blogspot.com.).

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Há almoço grátis. Para a banca

Folha de São Paulo: 11 outubro de 2011 CLÓVIS ROSSI

Há almoço grátis. Para a banca


O banco Dexia errou duas vezes, mas nem por isso os governos deixam de socorrê-lo com novo pacote


E lá vem de novo o sétimo de cavalaria para salvar não os mocinhos, mas os bandidos, digo os banqueiros. No caso, é o Dexia, o conglomerado franco-belga-luxemburguês, a ser socorrido -pela segunda vez- pelos governos dos três países.

Na prática, é o exato inverso do slogan "Ocupe Wall Street" que ganha adeptos nos EUA. O que os governos estão fazendo é financiar Wall Street ou, no caso específico do Dexia, a Place Rougier de Bruxelas, onde fica a sede central do banco.
É um claro desafio à regra básica do capitalismo, a de que "não há almoço grátis". Para a banca, não há apenas almoço grátis, mas também janta.

Afinal, o Dexia já havia sido socorrido em 2008, com imponentes € 6 bilhões. É um pouco menos do que os € 8 bilhões que a Grécia é obrigada a mendigar para poder pagar os salários de outubro de seus funcionários, entre outras contas, e que compõem a última fatia do crédito concedido por União Europeia/FMI para resgatar o país.

Diferença fundamental: o crédito à Grécia está amarrado a duríssimas condições que, entre outras tragédias, levaram a um aumento de 40% no número de suicídios nos cinco primeiros meses de 2011, na comparação com 2010. Uma linha telefônica para desesperados dispostos ao suicídio passou a receber mais de 100 chamadas por dia, quando a média normal era de 10.

Não consta que algum banqueiro tenha tentado o suicídio. Já estou até ouvindo o resmungar dos economistas de bancos e de seus amigos na mídia me acusando de demagogo por fazer esse tipo de comparação. Sacarão do coldre, como é de praxe, o argumento maroto de que banco não pode quebrar porque seria um prejuízo para todo o mundo, inclusive para suicidas em potencial.

Não se trata de pregar a estatização do sistema financeiro global, até porque banqueiros a soldo do Estado não pecam menos -nem mais- que os banqueiros privados. O problema está na recorrente estatização dos prejuízos, como ocorre agora no caso do Dexia, e na privatização do lucro. Assim até eu quero ser capitalista.

Não faz sentido o Estado ajudar a banca e não assumir o controle da gestão. Acaba sendo um convite para que os erros que levaram ao primeiro auxílio governamental se repitam e obriguem a um segundo pacote, como acontece com o Dexia.

Tampouco faz sentido permitir que bancos que só não quebraram porque entrou dinheiro público, na crise de 2008, continuem pagando salários e bônus obscenamente altos para os executivos que os arruinaram. Deveriam responder com o seu patrimônio pelos prejuízos.

Menos mal que duas figuras políticas relevantes estejam cobrando algo parecido. A presidente Dilma Rousseff, que quer que o G20 adote regulação estrita para o "descontrolado" sistema financeiro, e o presidente do Partido Social Democrata alemão, Sigmar Gabriel, para quem a palavra de ordem deve ser: "Nenhum centavo do Estado para salvar um único banco, a menos que aplique reformas profundas em seu modo de operar". Para Gabriel, a crise bancária está colocando para o mundo uma escolha entre "democracia ou o domínio das finanças". O que você escolhe?

crossi@uol.com.br