Mais uma vez a realidade mostrou que temos razão. Até o Banco Central (BC) está sendo forçado a admiti-lo. Segundo Octávio Barros, economista do Bradesco, “a desaceleração da atividade é clara o suficiente para fazer o BC alterar o ritmo da elevação dos juros”. Com efeito, o Conselho de política monetária (Copom) reduziu o ritmo de elevação dos juros para 0,5% na última reunião, e agora, com a divulgação da Ata, foi necessário ler nas entrelinhas o conjunto de desculpas esfarrapadas escritas em linguagem cifrada. As fofocas são muitas, e há quem pense em mudanças qualitativas dentro da diretoria do BC, com o afastamento de alguns “xiitas” ortodoxos seguidores do presidente do BC, Henrique Meirelles. Agora, se fala em “influência externa deflacionária e menor crescimento global” e em “uma trajetória mais condizente com o equilíbrio de longo prazo”, e projeta-se o horizonte da análise para 2012 e não para 2011 como era costume.
Por traz desta mudança de atitude do BC estão a impaciência do governo em ganhar as eleições e o medo, que cresce, da desaceleração da economia. O próprio BC, através do Índice de Atividade por ele calculado, já havia detectado esta desaceleração desde maio. Em junho, ela continuou e culminou no crescimento negativo do PIB em julho. Com isto, as estimativas de crescimento para este ano, que eram de 7,3%, já começaram a cair para 7%. O Ministério da Fazenda calculou que, em junho, o crescimento caiu para 0,7% e, em julho, conforme mencionado anteriormente, foi negativo: -0,1%. O crescimento do PIB, no primeiro trimestre, que foi de 2,7%, foi reduzido para 0,5%, no segundo trimestre e, no terceiro, continuará em baixa. A estimativa de 7% para o PIB do ano já está sendo corrigida para 6,5%. Até setembro, não se espera recuperação. Diante desta realidade, o secretário de política econômica, Nelson Barbosa, justificou que isto será resultado da queda da demanda externa que, até o final do ano, terá uma contribuição negativa de -2,1%, o que afetará o PIB, apesar do crescimento da demanda interna que deverá ser de 8,5% a 9%.
Enfim, eis o reconhecimento do que nós já previmos, desde o inicio do ano. O Brasil não pode ter um processo de recuperação sólido isolado deste velho mundo globalizado. E isto, apesar de todo o esforço do governo para forçar a recuperação. Para a tristeza do Ministério da fazenda, o país não agüentou manter as desonerações fiscais por mais tempo. No entanto, tem conseguido segurar o esforço de crédito oficial através do banco do Brasil (BB), da Caixa, do BNDES e do BN. Só o BB aumentou seus empréstimos em 36% no primeiro trimestre deste ano, atingindo R$ 327,4 bilhões. O BNDES recebeu um empréstimo de R$ 100 bilhões do Tesouro Nacional, lastreados nas emissões de títulos indexados à Selic (10,75% a.a.). O mesmo BNDES foi autorizado a fornecer empréstimos a taxas subsidiadas no Programa de Sustentação do Investimento (PSI). Isto mostra que a bondade do governo recai sobre o bolso do contribuinte que pagará a diferença dos juros.
Os outros programas do governo, como os programas sociais e o de habitação, também continuam tendo um poderoso efeito de arrastamento que se reflete nos índices de produção de todas as empresas relacionadas com a construção civil e na criação do terceiro turno de trabalho em muitas delas.
No conjunto da indústria, no entanto, a situação não vai muito bem. Um estudo feito pela UFRJ demonstra que, no primeiro semestre do ano, o valor das exportações de produtos industriais igualou-se ao das importações. Ora, há cinco anos atrás, as exportações eram 66% superiores às importações. Os valores exportados pela indústria tradicional ficaram 87% inferiores aos daquele período. Isto certamente tem forte influência da política cambial do BC e da falta de uma política industrial do governo.
O efeito da política cambial, além disso, tem outras conseqüências. No mês de junho, as contas externas apresentaram um rombo de US$ 5,18 bilhões. Os Investimentos Estrangeiros Diretos (IED) causaram grande decepção, pois, dos US$ 1,5 bilhões estimados, só chegaram ao país pouco mais de US$ 700 milhões. Para piorar a situação, os capitais estrangeiros enviaram, para fora do país, lucros no valor de US$ 1,728 bilhões.
Como havíamos previsto, a política econômica praticada pelo governo, sob a influência do BC, sob o comando do H. Meirelles, continua a dificultar as intenções do próprio governo, desesperado para manter o ritmo de crescimento da economia a qualquer custo, diante da aproximação das eleições.
Nelson Rosas Ribeiro: Professor do Departamento de Economia da UFPB e coordenador do Progeb-Projeto Globalização e Crise na Economia Brasileira. Email: progeb@ccsa.ufpb.br
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