Semana de 22 a 28 de abril
de 2013
Lucas Milanez de Lima
Almeida[i]
Dois
renomados economistas, da também renomada Universidade de Harvard, chegaram à
seguinte conclusão no ano de 2010: quando a dívida pública de um país atinge um
patamar, que representa 90% de tudo aquilo que a nação é capaz de produzir em
um ano, há uma tendência à supressão da atividade econômica de tal monta que
esta produção pode ser menor do que foi no ano anterior.
Pois
bem. A partir de dados históricos sobre 44 países de características distintas,
nos últimos 200 anos, o estadunidense Kenneth Rogoff e a ex-cubana, agora
também estadunidense, Carmen Reinhart, utilizaram uma série de instrumentos
estatísticos e informáticos e publicaram seus resultados na American Economic
Review e no National Bureau of Economic Research. Segundo os autores, nos
países onde a razão da dívida pública pelo PIB atingiu um percentual de até
30%, a taxa de crescimento do PIB do respectivo país ficou entre 3% e 4%;
quando a proporção situou-se entre 30% e 60%, a taxa de crescimento permaneceu
entre 2% e 3%; nos países onde a razão dívida/PIB ficou entre 60% e 90%, o
crescimento percentual foi entre 3% e 4%; porém, os países que apresentaram uma
dívida equivalente a 90% ou mais do seu PIB anual, a taxa de crescimento foi
próxima de zero, chegando a ser negativa (-0,1% em média).
Durante
anos, principalmente nos últimos três, estes resultados foram consagrados e se
tornaram um “Santo Graal” da “teoria econômica oficial”, sendo citados por,
pelo menos, 103 autores de livros, artigos, ensaios, etc. Serviram também como fio
condutor para a ação fiscal (decisões de despesas e receitas) da maior parte
dos governos dos principais países do mundo. Se, quanto maior o endividamento
menor o crescimento, então os governos deveriam primar pela redução dos gastos
e elevação das receitas. E esta foi a bandeira levantada, principalmente, pelos
Estados europeus e pelos países que seguem o receituário neoliberal:
austeridade custe o que custar. As consequências destas medidas podem ser
vistas nos indicadores socioeconômicos e nas manifestações populares de países
que seguiram a risca o modelo, tais como Grécia, Portugal e Espanha.
O
problema é que, um mero doutorando da Universidade de Massachusetts, chamado
Thomas Herndon, resolveu fuçar o porquê de tantos outros economistas terem
tentado replicar o mesmo instrumental usado por Rogoff e Reinhart sem obterem
resultados semelhantes. Para isto, juntamente com Robert Pollin e Michael Ash,
Herndon pegou os dados originais e refez todos os passos. Supreendentemente (ou
não...), chegou-se à conclusão de que ocorreram erros no procedimento original.
Baseando-se
no texto publicado recentemente por Herndon, Tomas Rotta, da Carta Maior,
afirma que “Rogoff e Reinhart, em bom português, usaram uma metodologia
altamente duvidosa com exclusão seletiva de dados, manipulação injustificável
dos pesos e, pior ainda, erro nos códigos das médias. Se corrigidos, os
resultados apontam que países com relação dívida/PIB acima de 90% crescem em
média 2,2% ao ano, e não -0,1%”.
Diante
deste “pequeno erro”, parece que os austeros governantes do velho continente
estão começando a corrigir suas cartilhas e receitas de crescimento sustentado.
O presidente da Espanha, país símbolo da crise na Europa, com uma taxa de
desemprego de 27%, para toda população economicamente ativa, e 57% para os
jovens, Mariano Rajoy, já iniciou as discussões acerca do orçamento de 2014 e
2015 defendendo a redução no arrocho. Para já, foi anunciado um pacote de
estímulos que, em quase nada, lembra as políticas até agora praticadas. Em
Portugal, apesar dos problemas criados por algumas empresas estatais, já houve
o anúncio de um plano de estímulos fiscais à economia, onde o desemprego atinge
17% e a previsão para o PIB de 2013 é de queda de 2,3%.
Não
foi só o estudo que provocou as mudanças na política europeia. José Manuel
Barroso, presidente da Comissão Europeia, admitiu que os países com os maiores
arrochos são aqueles que têm os menores avanços fiscal e econômico. Até o FMI
já vê com bons olhos o afrouxamento em tais medidas. Já é um consenso entre os
economistas “não oficiais” que a austeridade por si só não garante o
crescimento da atividade econômica. A teoria que sustentava isto já foi
abalada.
Agora
a esperança é encontrar alguém que questione outro “Santo Graal” da “teoria
econômica oficial”: de que o melhor (e único) remédio para a inflação é a taxa
de juros.
[i] Professor
do Departamento de Economia da UFPB e pesquisador do Progeb.
(www.progeb.blogspot.com.)
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