Semana de 14 a 18 de maio de 2014
Rosângela Palhano Ramalho
[i]
Caro leitor. Se você ainda não ouviu falar em Thomas Piketty,
saiba que, é o economista francês mais comentado do momento. Seu livro
recentemente lançado “O Capital no século XXI”, deu a Piketty, nos Estados
Unidos, o status de rock star. Mas, qual a novidade que está
por traz das suas opiniões? Mesmo não tendo acesso ao livro, que logo será
editado no Brasil, a leitura dos comentários nos permite fornecer uma ideia
geral do seu conteúdo. Em 970 páginas em francês e 685 em inglês, o economista
discute a questão da desigualdade e conclui, com o uso de estatísticas bastante
abrangentes, que a tendência geral é de que as sociedades se tornem cada vez
mais desequilibradas. A dinâmica da acumulação capitalista, segundo ele, gerará
uma espiral de desigualdade fora de controle. Como uma nave sem piloto, o mundo
caminha para a tragédia. Ao citar o exemplo dos Estados Unidos, Piketty mostra
que os 10% da população de rendimento mais elevado que possuíam 30% a 35% da
renda total, passaram a possuir mais de 50% hoje, e mesmo nos países mais
igualitários, como a Suécia e a Suíça, esta proporção vem aumentando com o
tempo. O acompanhamento das séries de longo prazo, conclui o economista, mostra
que a tendência é a de que o rendimento do capital continuará superior às taxas
de crescimento e com isto elevará a concentração da renda, a níveis tais que
ameaçará o funcionamento das instituições democráticas.
Desde o início da crise atual que são lançados estudos sobre
este tema. A Suécia, por exemplo, país citado nas análises de Piketty, é a
nação rica onde a desigualdade cresce mais rápido, segundo a Organização para a
Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE). As estatísticas mostram que
desde 1985, considerando um grupo de 34 países ricos, a Suécia se destaca por
apresentar alto crescimento da desigualdade. Na década de 90, os 10% mais ricos
da população sueca apresentaram uma renda quatro vezes maior que a renda dos
10% mais pobres. Em 2008, este número subiu para seis vezes. Em 2010, a taxa de
pobreza registrada na Suécia foi de 9%, o que representa mais do que o dobro do
número registrado em 1985.
O leitor que acompanha esta coluna sabe que partilhamos
da ideia de que a acumulação capitalista promove e acentua as desigualdades,
através do aumento do fosso que divide os ricos dos pobres. Tal fato é inerente
ao próprio processo de acumulação capitalista. Em nossas análises já trouxemos
inúmeros exemplos dos artifícios utilizados pelo capital para se expandir e se
apropriar de parcelas cada vez maiores da renda, fenômeno há muito tempo discutido
pela teoria marxista. O que nos admira é justamente a surpresa de alguns economistas
com estas questões que são tão antigas quanto o próprio capitalismo.
Lembremos alguns exemplos recentes de como os grandes
capitais, através da exploração da mão de obra barata, garantem a acumulação.
No Vietnã, ocorreu uma onda de protestos causada pela decisão da China em explorar
petróleo em águas profundas nas Ilhas Paracel, território de disputa entre
chineses e vietnamitas. O curioso, é que, os protestos acabaram prejudicando
grandes empresas como a varejista Walmart, a Nike e a Adidas, que tem parte de
suas cadeias produtivas sediadas naquele país. As redes já fugiram da China, em
virtude do aumento do custo da mão de obra. Estão indo embora de Bangladesh,
por causa do acidente gravíssimo em uma fábrica têxtil que matou mais de mil
trabalhadores, e também fogem da Tailândia, em razão dos riscos políticos.
Resta então explorar o continente africano. A Rede de cartões Visa, já está na
África, precisamente em Ruanda, tentando convencer aquela sociedade dos grandes
benefícios em obter créditos e utilizar o pagamento eletrônico. A própria China
está levando literalmente seu chão de fábrica para a África. Fabricantes de
caminhões, calçados, peças para televisores, tubos de aço e têxteis, estão
transferindo suas instalações para Uganda, Angola, Zimbabue, Etiópia e Zâmbia,
por causa dos baixos custos da mão de obra comparados aos custos chineses.
Os problemas fundamentais relativos à dinâmica da
acumulação capitalista já haviam sido previstos por Marx. Thomas Piketty, agora
apelidado de Marx I, propõe, para resolver a trágica acentuação da
desigualdade, a adoção de um imposto progressivo mundial sobre o capital.
Com todo o respeito que a
obra do autor possa merecer temos de concluir que a montanha pariu um rato.
Esta é a grande diferença entre ele e Marx, pois para Marx,
a superação destes problemas, gerados pela lei geral da acumulação capitalista,
está na superação do próprio capitalismo.
[i] Professora
do Departamento de Economia da UFPB e pesquisadora do Progeb – Projeto
Globalização e Crise na Economia Brasileira. (www.progeb.blogspot.com)
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